Ravindra Kelekar, Panthasth, Panaji (Goa), Rajhauns Publishers, 2000, pp. 206 Preço: Rs. 150.

 

O autor é uma figura de destaque entre os escritores goeses em Concani. Contribuiu muito para o reconhecimento da língua-mãe dos goeses. Neste livro em que conta as suas memórias e experiências quando tinha 21 até 23 anos de idade, anos de protestos políticos (satyagraha) inaugurados por R.M. Lohia em Margão em 18 de Junho de 1946, revela também como chegou a apreciar a importância de defender os interesses linguísticos dos goeses. “Uma língua mãe sustenta um povo sem ele ter que aprendê-la” !  Reconhece o papel de Varde Valaulikar ( melhor conhecido por Shenoy Goembab) nessa sua caminhada intelectual em prol do Concani.

 

A obra não é bem uma autobiografia, e prefere defini-la como “memórias de um caminhante” (peregrino = panthasth) no processo histórico da resistência ao colonialismo. Revela os conflitos internos dos goeses e o conflito de personalidades que queriam protagonizar a luta de libertação. Acentua este factor como responsável pela incapacidade de conseguirem um apoio maior de Mahatma Gandhi. Está convencido que sem essas lutas internas e com maior apoio de Gandhi a libertação política de Goa teria sido possível muito antes de 1961.

 

Enaltece o papel exercido por alguns católicos, como Luis de Menezes Bragança, a sua filha Berta, o seu primo Tristão Bragança Cunha, e Evagrio Jorge, todos eles mal-vistos pelos goeses católicos “presos” na teia ideológica da Igreja afecta ao sistema colonial. Mas diz que a impressão que prevalecia entre os combatentes pela liberdade era de que somente os hindus eram patriotas, e que os cristãos todos eram como Froilano de Melo! (p. 29) Descreve a arrogância dos “mestiços” e dos oficiais brancos que preocupavam-se mais em agradar a Salazar. Ilustra as suas afirmações com vários casos concretos que presenciou.

 

Curiosamente, Ravindra Kelekar dedica um bom número de páginas da parte final (pp. 164-206) ao assassinato de Humberto Delgado. E justifica: Quero que os goeses que lutaram pela liberdade saibam que também os portugueses sofreram muito sob a dominação “pidesca” do Estado Novo. Deixa um conselho aos goeses: “Temos que reatar os laços de amizade com os portugueses livres, e não transferir contra todo o povo português a nossa ira dos tempos de Salazar. Portugal de hoje não é Portugal de Salazar, e é importante conhecermos melhor este Portugal.”

 

Acho que os goeses (e todos os interessados)  em Portugal deviam conhecer os autores goeses que escrevem em Concani, especialmente os autores como Ravindra Kelekar, que representam a geração dos goeses hindus, e não só, que representam os ideais patrióticos que prevaleceram contra o colonialismo, e que continuam a ser a consciência de liberdade contra os abusos de democracia pós-colonial em Goa. Uma tradução desta obra em português e em inglês poderia ajudar a promover uma mútua compreensão entre goeses de gerações diferentes e goeses que vivem dentro e fora de Goa, bem como para a recuperação de laços de amizade entre Goa e Portugal.

 

Teotónio R. de Souza